sábado, 27 de junho de 2015

MINHA FILHA, A TUA FÉ TE SALVOU

Reflexão de Georgino Rocha


«Superior ao rigor do castigo
está o impulso da necessidade,
a certeza do amor»



Jesus está à beira mar. Chega Jairo, um dos chefes da sinagoga de Cafarnaum e pede-lhe para ir a sua casa. No caminho ocorre um encontro singular que Marcos realça com pormenor e beleza. Mc 5, 21-43.
Uma mulher, sem nome, deseja ser curada da doença de fluxo de sangue, pois anda cansada de sofrer e estás prestes a desanimar. Já havia gasto “todos os seus bens “ nas mãos dos médicos. Ouve falar de Jesus e sente-se atraída pela sua fama. Decide meter-se na multidão e, destemida, ir avançando até se aproximar dEle e lhe poder tocar no manto. Este gesto era punido pela lei judaica. Mas superior ao rigor do castigo está o impulso da necessidade, a certeza do amor, a força da confiança que pressentem a possibilidade da cura desejada. E, de facto, assim acontece! O diálogo que se segue é enternecedor e pode ser condensado na declaração de Jesus: “Minha filha, a tua fé te salvou”.


Este encontro singular é memória do ocorrido que denuncia tantas outras situações a necessitarem de quem lhes preste a atenção solícita e curativa que Jesus revela e realiza. Quantas pessoas com “feridas secretas” na sociedade e na Igreja?! A sofrerem horrivelmente e sem esperança porque estão rotuladas, proibidas, marginalizadas. Os sem-abrigo. Os ex-reclusos. Os dependentes da droga, da prostituição e tantos outros. Como a mulher do Evangelho, sem nome, marcada pela crença que lhe haviam incutido os mestres da lei: impura pela perda de sangue, dom divino. Tantas pessoas que não têm a quem confiar a sua dor sofrida, que buscam ajuda e consolação, sem saberem a quem recorrer. Sentem-se culpáveis quando muitas vezes são apenas vítimas. (Pagola). 

Pessoas boas que se consideram indignas de receber Cristo na comunhão porque a sua consciência “doentia” lhes proíbe, em virtude de cargas morais que pouco têm a ver com o Evangelho da misericórdia; crentes que, ao final da vida, não encontram alívio para o peso martirizante do remorso nem abertura para beneficiar do perdão e da ternura de Jesus. No entanto, a sua pessoa irradia força sanadora e regenerativa, proximidade atenta e solícita, sintonia compreensiva e afectuosa. Quantas pessoas a quererem tocar Jesus pois sabem que nEle encontram a dignidade ofuscada e, por vezes, conspurcada por tradições e culturas que moldam um pensar generalizado com efeitos tão negativos e desumanos.

A cura da ferida secreta da mulher anónima tem um sentido novo. A libertação da anomalia funcional do organismo feminino abre horizontes novos: a mulher recupera a saúde, readquire o seu bom nome, a sua honra, é reintegrada na sociedade, sente-se perdoada e abençoada por Deus, pode fazer com normalidade as práticas religiosas, retoma os caminhos da salvação. Com a restituição da saúde fisiológica, muitos outros bens lhe são concedidos: a nível interior e exterior. A harmonia é refeita em todas as dimensões da pessoa. A cura é integral! A atitude de Jesus continua cheia de actualidade em todas as áreas, sobretudo nas da medicina da vida, dos cuidados de saúde, das pessoas e instituições envolvidas neste processo. Quem pode deixar de projectar, sobre a realidade social, a luz que brilha nesta forma de proceder?

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