sábado, 27 de fevereiro de 2016

É urgente dar frutos de boas obras

Reflexão de Georgino Rocha

Georgino Rocha
«É urgente acolher 
a paciência de Deus que brilha»


Jesus recebe notícias trágicas e reage com lucidez espantosa, aproveitando para apresentar a novidade do agir de Deus na história. São notícias do massacre de pessoas indefesas enquanto estavam no templo a praticar o culto; massacre levado a efeito pelo poder político com rosto pessoal – o de Pilatos. Ontem como hoje. E o cortejo de vítimas é incontável. Infelizmente.

Outra notícia triste refere-se à queda da torre de Siloé que causa danos graves e mata gente inocente. Sem dizer nada sobre o motivo de tal ocorrência, Jesus avança com a pergunta de interpelação pedagógica: “Pensais que eram mais culpados do que todos os outros moradores de Jerusalém?” E acrescenta: “De modo algum, vo-lo digo Eu”. O contraste evidencia o começo da novidade do proceder de Deus em relação às pessoas e a toda a humanidade.

A mentalidade dos ouvintes condizia com o normal, o natural. A chave religiosa para fazer a leitura dos factos era a de que a desgraça ocorrida provinha de algum crime ou pecado cometido. Merecia castigo sem pena nem medida. Abundam nas narrativas do Evangelho ecos desta maneira de pensar tão defendida pelos fiscais das leis. A justiça punitiva tinha o seu fundamento no agir de Deus e tomava forma humana em sentenças e ditos que perduram ainda hoje. A imagem de Deus como atento observador e exemplar castigador impunha-se por todo o lado, gerando um medo de terror e, progressivamente, a mais viva repulsa.

Jesus quer corrigir esta maneira de pensar e de agir. Convida a uma mudança de olhar que brota da sabedoria do coração e dá origem a uma nova atitude para com Deus. Visualiza esta novidade na parábola da figueira plantada no meio da vinha. O normal e natural era que desse figos no tempo devido. Mas já lá iam três anos e nada. O dono que persistentemente ia para os apanhar encontrava-se com a esterilidade da figueira. O normal e natural é que haja um tempo para tudo. Mas o cuidador da vinha toma uma atitude diferente e pede um prazo de prolongamento. E prontifica-se a fazer um trabalho diligente e esforçado: “Vou cavar em volta dela e deitar adubo. Quem sabe, talvez venha a dar fruto! Se não der, então corta-la-ás”.

Transpondo os figurantes para a mensagem cristã, pode ver-se Deus como o dono da vida, Jesus o zeloso cuidador, o povo judeu e, nele, cada um de nós e a camunidade cristã, a figueira na última oportunidade que lhe é concedida. A parábola deixa a narrativa em aberto, suspensa, à-espera de que aconteça o melhor: figos saborosos e abundantes.

A figueira da vida está plantada na vinha do mundo. A fecundidade ou esterilidade manifesta-se nas acções humanas de cada pessoa e da sociedade, no funcionamento das suas instituições, na justeza das políticas públicas. Ninguém está sozinho na história da sua vida. Todos somos cúmplices e solidários no bem e no mal. Há omissões mais lesivas da dignidade humana do que certas acções. Veja-se o rico acomodado que nem sequer se digna olhar para o pobre Lázaro que, cheio de fome e de chagas, pedia ao menos as migalhas que caiam da sua mesa.

O dono da vinha introduz na agir normal e natural uma nova dimensão. O seu poder manifesta-se na força do perdão; a sua justiça é sobretudo regenerativa; o seu amor é misericórdia compassiva; a sua paciência gera sempre novas oportunidades; a sua confiante espera só se “esgota” quando a pessoa humana rompe definitivamente todos os laços de comunhão.

A nossa figueira pessoal merece o melhor cuidado. É urgente matar tudo que destrói a sua vitalidade: o bicho do egoísmo e da indiferença, da rebeldia interior e da interferência de ruidos que abafam a voz da consciência e tantos outros vírus daninhos. É urgente aproveitar o tempo e produzir obras de bem e de justiça, de solidariedade voluntária, de sobriedade de exuberâncias, de cuidado dos mais frágeis e indefesos, de quem se vê abafado pelo sufoco do stresse e precisa de um ritmo humanizado de vida. É urgente acolher a paciência de Deus que brilha, de modo tão expressivo, na sua misericórdia compassiva.

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