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sábado, 12 de dezembro de 2015

Conto de Natal

Gisela



Gisela entrara melancólica. Na entrada geral, ao lado do jardim da Escola, um presépio em madeira, com figuras em tamanho natural, anunciava a quadra que se avizinhava. De longe vinham uns acordes suaves, confirmando o clima que se vivia - o Natal.
No átrio da Escola, a decoração era exuberante. Vitrais multicores e duma grande subtileza de formas, ornamentavam a portada principal. Do lado esquerdo, erguendo-se por entre fitinhas douradas e plissados coloridos, surgia o primeiro pinheirinho de Natal, que servia de cenário aos bonecos de neve, gigantes e apelativos. Tão fofos, tão grandes e simultaneamente tão acolhedores.
Gisela teve o seu primeiro choque. Tanta luz, tanta cor, tanto empenho humano, a contrastar com o cinzento-escuro de que se vestia a sua alma. E veio-lhe, à memória, a família que ficara em casa. O Simão ficara ainda na cama, donde iria sair com a dificuldade de todos os dias, para ter a sua própria festa de Natal. Iria ter? Chegaria a integrar-se em alguma actividade? Teria algum entusiasmo pelo seu dia de festa?

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Um Conto de Natal: O meu amigo Xavier



No recreio da escola que frequentámos, já lá vão boas décadas, o Xavier dava nas vistas. Na formação das equipas, com a malta alinhada à espera da escolha, o Xavier orientava o processo e ditava as leis, sem ninguém resmungar, não fosse isso motivo para em próxima operação o resmungão ficar de lado. E os jogos, de futebol e outros, lá decorriam com o Xavier a tirar dúvidas ao jeito de árbitro sabido e experimentado. Era um líder natural e respeitado. 
Noutros momentos, sem jogos por não haver tempo para isso, as conversas em que participava mostravam um jovem atento e dialogante, amigo do seu amigo, parcimonioso com os colegas menos conhecidos, frontal na defesa das suas posições e ideias, mas respeitador, aceitando que cada um era livre de pensar e de dizer o que bem entendesse, sem ferir ninguém. A nossa amizade vem daí e assim tem continuado. 
A vida do Xavier deu muitas voltas. Profissional competente e esforçado foi saltando de emprego em emprego ao sabor da vida e das necessidades da família, que na idade própria constituiu por amor à Joana a quem se uniu para sempre. Filhos e netos encheram-lhe o regaço e disso me dava conta espontaneamente, em conversas fugazes ou mais prolongadas, em horas de confidências que nos eram comuns. 
Viajar, por razões profissionais ou familiares, passou a hábito apaixonado. E quando regressava das suas andanças gostava de me contar o que havia deparado de belo, desde paisagens e ambientes que lhe emolduravam o sorriso, desde pessoas e culturas exóticas que o levavam a garantir que haveria de conhecer melhor, desde regimes políticos e civilizações que o entusiasmavam e sonhava ver entre nós, desde catedrais esplendorosas que o deixavam extasiado e até capelinhas que indiciavam devoções fervorosas. 

domingo, 24 de dezembro de 2006

A melhor prenda de Natal

O Albano acordou na segunda-feira com o firme propósito de resolver de uma vez por todas o problema das prendas de Natal. Todos os anos sentia o mesmo dilema, sem saber o que oferecer na noite de consoada aos seus familiares. A esposa, essa sim, tinha jeito para tais coisas. Sempre estava mais disponível e não tinha preocupações que a incomodassem. O Albano era diferente. A empresa ocupava-o todos os momentos de todos os dias, ou não o obrigassem a isso a crise económica que domina o país e alguns conflitos com um ou outro trabalhador, que há sempre quem esteja insatisfeito com o ordenado que recebe, como ele tantas vezes dizia. Por isso, escasseava-lhe o tempo para pensar em prendas. Mas o Natal ainda o motivava para se mostrar generoso com quem mais o ajudava nos negócios e com os familiares mais próximos. Restos de uma educação cristã que havia recebido em criança e do ambiente solidário que a época natalícia propicia. 
As prendas dos mais directos colaboradores eram fáceis de encontrar. Mais uns dinheiros, para além do subsídio do Natal e do habitual salário mensal, e não era nada mau. Assim, receber quase três meses de uma só vez sempre será muito bom para que os trabalhadores bem comportados possam passar esta quadra mais folgadamente, costumava dizer o empresário, em jeito de quem gosta de mostrar a sua generosidade. Os outros, os que levam a vida a protestar, esses que aprendam a viver e para o ano logo se verá, sublinhava o Albano, quando alguém o criticava por só olhar para alguns. Agora, com a esposa, filhos e pai é que é mais complicado. 
Com os primeiros, porque ficam sempre descontentes e à espera de mais, e com o velho, internado num Lar da Terceira Idade, porque nunca reclama nada. Que está tudo bem, que os netos é que precisam, que há pobres a quem falta tudo, que há gente que passa fome, que há refugiados de guerra, que há imigrantes entre nós sem trabalho. Mas para ele, que tem cama, mesa e roupa lavada, nada mais é preciso, garantiu no ano passado ao Albano, quando lhe foi levar um livro como prenda de Natal. 
Um livro que o velho afinal nunca abriu. Olhos cansados, uma melancolia que o tem invadido, um gosto pela solidão que ninguém entende, diz a família a quem pergunta por ele. O pai do Albano, Alberto Ferreira, funcionário numa Repartição de Finanças durante uma vida, sempre foi uma pessoa amável e prestável. No fim da carreira, já ajudava a resolver problemas de filhos e netos de contribuintes que o viram entrar na repartição. Conhecia toda a gente e para todos os que se abeiravam dele tinha palavras amigas, entrecortadas pelas últimas anedotas políticas, de que era um exímio mas prudente coleccionador.