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quinta-feira, 20 de julho de 2017

Um conto de Valdemar Aveiro — Heróis que o tempo não apaga


“Heróis que o tempo não apaga — Um conto real de vida” é mais um trabalho de Valdemar Aveiro, em edição da Fundação Gil Eanes, com apoio da Jerónimo Martins. Trata-se de uma publicação bilingue (Português e Inglês) destinada, decerto, a leitores e estudiosos da saga dos bacalhaus, de que foram protagonistas muitos dos nossos antepassados, os tais heróis que não podem cair no saco do esquecimento porque o autor, como outros, não deixa que tal aconteça.
A edição, capa dura, papel de luxo e muito ilustrada é um regalo para os olhos e lenitivo para quem ainda transporta na alma as dores da solidão, do trabalho sem horário e sem descanso, da ausência da família, da impossibilidade ao menos de um simples contacto.
José Maria Costa, presidente da Fundação Gil Eanes, na Apresentação, diz que o autor nos descreve «a angústia destes bravos pescadores que, para além de viverem em condições desumanas, com enormes carências, experimentaram a fragilidade dos dóris, rezando para que o número de homens embarcados fosse o mesmo à chegada da campanha». 
No Prefácio, Artur Aguiar, sublinha que, «Conhecer o capitão Valdemar é perceber que existe uma pessoa com diversos talentos» em que sobressai «um dom que é o de saber falar, saber sentir e expor, escrevendo, a alma que invade o espírito de todos, desde o mais nobre ao mais plebeu». 
O capitão Valdemar Aveiro, ilhavense de raiz, mas gafanhão de coração, ou não tivesse ele brincado com crianças da Gafanha da Nazaré, que evoca com frequência e com sentimento, é um artista na arte e escrever, sobretudo quando ao correr da pena nos brinda com cenas dos seus quotidianos, mesclados, quantas vezes!, de ficção saborosa.
Contudo, refere o autor de “Heróis que o tempo não apaga — Um conto real de vida” que «Este conto não tem nada de fantasioso», afiançando que, «apesar de terem já passado sessenta e cinco anos», continua «a ver e a sentir a dureza crua que aqueles homens enfrentaram, todos os dias, na luta estóica que travavam com espírito de missão». E aproveita a ocasião para lembrar que, na sua opinião, «a “Solidão” e o “Isolamento Trágico” não são necessariamente realidades exclusivas de regiões desérticas. Elas encontram-se facilmente no meio de multidões». 
É pertinente destacar a dedicatória que antecede o conto. Diz assim:

«Este pequeno conto de vida, real e não ficcionado, é dedicado com muito respeito e admiração a todas as mulheres que pelos mais diversos motivos, passaram a vida na condição de “viúvas de homens vivos”.»

Nota: Arquivo fotográfico de diversas pessoas e entidades; seleção, edição e composição de fotografia de Rui Bela; tradução de Tim Oswald; Design de Rui Carvalho Design; 

Fernando Martins

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Conto de Natal — Nicholas

Conto de Maria Donzília Almeida




Do Santa Claus, herdara o nome e a destreza física. O primeiro deslizava pelas planícies geladas da Lapónia, num trenó puxado por renas amestradas, numa correria expresso, para entregar as prendas a tempo e horas. O segundo fazia piruetas e cavalos com a sua bicicleta, na rua onde morava, para expandir o excesso de energia que o dominava.
Era vê-lo correr, com o rabito levantado, do selim, ou exibir o seu talento de malabarista, levantando a roda da frente, tal qual garboso cavalo, arqueando as patas dianteiras.
Nicholas era um adolescente cheio de vivacidade, com os fartos cabelos louros, caindo-lhe em anéis sobre os ombros, ou presos atrás, em rabo-de-cavalo, com ar desafiador perante a vida e muita contestação reprimida.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Das minhas memórias para este Natal

O nosso Menino Jesus 

A recordação que hoje publico em Memórias Soltas vem de há décadas. A estória verídica, salpicada com um pouco de ficção, nunca me deixou, ocupando um recanto especial do meu coração. Já não vejo o Américo nem sei há quantos anos, mas o seu rosto envelhecido, não pela idade mas pelas agruras da vida, jamais me abandonou. Emigrou para a Alemanha, graças a um amigo meu já falecido, de onde veio um dia, pelo Natal, para me visitar e agradecer o pouco que por ele fiz. 
Onde quer que ele esteja, daqui lhe envio um abraço de muita amizade, na certeza de que o Menino-Deus o há de proteger sem o repreender por ter sete filhos.

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

O filho pródigo

Um conto de Natal 
de Maria Donzília Almeida



Na cozinha, as mulheres da casa afadigavam-se na preparação da ceia de consoada. O prato típico da quadra iria aparecer com todo o esmero, na mesa que reuniria a família. O bacalhau fora demolhado com a antecedência conveniente, as batatas cresciam em grande alguidar, juntavam-se as cenouras, os ovos e a couve penca de Chaves. Era uma couve tenrinha que o avô cultivava ali,no quintal da casa e que se orgulhava de ostentar, fazendo jus aos seus dotes de hortelão.
Numa mesa redonda, vistosamente coberta por uma toalha colorida, em tons verde e vermelho iam aparecendo em grandes travessas, os doces que faziam as delícias dos comensais: os bilharacos, o arroz-doce,  a aletria, as rabanadas, o bolo-rei, os frutos secos, etc.

sábado, 28 de junho de 2014

ESTÓRIA IGUAL A TANTAS OUTRAS

No meu novo blogue, Memórias Soltas, estou a publicar apenas, e já não é pouco, estórias e contos.Hei de falar de pessoas e vivências várias que guardei na gaveta das boas recordações. Hoje postei O Regresso do Irmão Pródigo, retrato com alguma ficção de uma vida igual, decerto, a tantas outras. 

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

O filho pródigo


Um conto de Maria Donzília Almeida

O Scott


Apareceu abatido, escanzelado, cabisbaixo. Esta atitude de prostração, contrastava com a sua natural energia, diria até, uma euforia que marcava a sua personalidade. Era um jovem cidadão, neste mundo cão, em que nos encontramos, no nosso dia-a-dia. 
Metia dó contemplar o aspeto de alguém que sofrera os reveses da vida! 
Da vergonha resultante do destino que lhe fora traiçoeiro, nem sequer ousava enfrentar a família e olhar os seus entes queridos, de cara a cara. As forças e a humilhação pela derrota sofrida, retiravam-lhe a coragem e a firmeza do olhar. 
Partira, na véspera de ano novo, enfeitiçado pelo barulho das luzes e pelo estrondo dos foguetes! Deixara para trás o lar acolhedor que o adotara como filho legítimo e partiu à procura da aventura, do desconhecido. Vagueara, sem rumo certo, por ruas e becos esconsos, aproximara-se de restaurantes de luxo, onde saciava a sua fome de imprevisto e...deambulara-se, por uns intermináveis quatro dias, sem rei, nem roque! 
A família de acolhimento, já chorava a perda e desaparecimento do seu ente querido e contactara as forças de segurança, para se porem no encalço do foragido. 
Apareceu, encaminhado por outra criança, que ouvira o apelo lancinante da sua teacher....que perdera o seu cãopanheiro. Sensíveis que são a estes problemas, rapidamente se puseram em campo e eis que o Scott se reencontrou com a dona, no seu jardim das delícias! 
De tão maltratado, exibia, no dorso um enorme ferimento, em carne viva, resultado das lutas que travou, com qualquer assaltante de estrada! 
Mas...não ouviu ralhetes, imprecações, censuras! O coração da família, ali estava aberto, recetivo, cheio de perdão e de amor para compensar a dor da derrota, da vergonha, da transgressão. 
O melhor manjar foi dispensado a “Mr Scott”, que não se fez rogado e uma semana após o bem-aventurado regresso, readquiriu toda a sua energia incontida, bem manifesta nos despojos do seu velho edredão de penas!!! 
Até um casaquinho, de tecido tigrado, saltou da gaveta onde se guarda o enxoval canino e foi vestido a sua eminência, o lorde cá de casa! 
Saber perdoar...é a virtude, que a dona demonstrou, para com os atos irrefletidos desta criança imatura! 
E...a parábola do filho pródigo, agora em contexto canino, repetiu-se, sempre nova, sempre atual! 

10.01.2013 


quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Conto maravilhoso


Zé da Rosa

15 de Outubro de 2009

Foi num canteiro deste belo jardim, à beira ria, nos primórdios do século passado, que aquela rosa desabrochou. Não foi numa Primavera florida, tampouco num Verão escaldante, mas num Outono incipiente, que a flor deu o seu fruto. Um bebé redondinho de feições, com uma boquinha bem desenhada e que seria portador do genes dos grandes homens! Foi a alegria de sua mãe, que assim deu mais um irmão à família.
De tão amado e acarinhado pela sua mãe, passou a ser conhecido pelo Zé da Rosa! Todos o conheciam assim, mesmo quando as suas feições de menino deram lugar àquele rapagão, alto, bem parecido que fazia andar à roda, a cabeça das moçoilas do seu tempo.
Sim, o Zé, como todos os mancebos da sua idade, andava na mira duma moça que lhe enchesse as medidas! Um dia, apareceu aquela rapariga trigueira de olhos azuis... ah... essa ... foi a Luz dos seus olhos, que nunca mais a perderam de vista. Com a ajuda do Cupido, os dois se enamoraram e até casaram! Coisa inusitada nas sociedades modernas, em que os juramentos de amor têm a duração da época estival! É curta e efémera!
Naqueles tempos antigos, ainda era uma realidade concreta, o compromisso entre pessoas e a dedicação era exclusiva e ad aeternum!
Dessa Luzinha, resultaram clarões luminosos, que haveriam de iluminar a vida de ambos. Cinco, pelo menos, ficaram para a história e também se multiplicaram noutros feixes de luz... que passaram a alumiar o mundo.
Com ascendência da Rosa e numa forte envolvência da Luz... só poderiam ter resultado uns belos rebentos que haveriam de fazer as alegrias dos pais.
A autora destas linhas.... nasceu no apogeu da vida de ambos os progenitores.... 30 anos! Daí...
Este pai esfalfou-se durante toda uma vida, aquém e além fronteiras, para que nada faltasse aos seus descendentes. Fez os possíveis, e hoje tem... quem lhe perpetue a memória e a robustez do carácter. Do carácter e do corpo, pois é um vivo exemplo do princípio “Mens sana in corpore sanu”.
Devo referir que é o responsável pelas “proezas” que esta criatura tem feito ao longo da vida.... não arcando, contudo,... com a responsabilidade das “avarias”(!?) .... que a mesma tenha praticado! Estas, se as houve, são da exclusiva autoria da mesma!
Esta personagem, quase de conto de fadas é a pessoa que hoje completa nove décadas de existência!
E... augúrios de uma ainda gratificante jornada é o que lhe manifesta esta descendente... orgulhosa da sua herança genética!

M.ª Donzília Almeida

17.09.09

domingo, 28 de dezembro de 2008

Suave Aparição

Eu sou AQUELE...
Desde que fora assolada por violenta tempestade, na sua vida, procurava, afanosamente, a sua alma gémea, a sua companhia de jornada, o seu alter ego! Desde os píncaros gelados e puros do Kilimanjaro, onde a atmosfera rarefeita condiciona a existência de vida, até aos pântanos nauseabundos da WWW, onde a diversidade biológica é surpreendente, tudo fora analisado e estudado, minuciosamente! Se no primeiro lugar, mal deparara com algum exemplar da espécie humana, no segundo, pululavam aos magotes, atropelando-se e “chafurdando” no lodo! Dalila, empurrada para uma solidão forçada, ainda acreditou que a Divina Providência a recompensaria por todo o seu empenho e esforço, na construção de caminhos úteis. Afinal, a vida havia-lhe demonstrado que são os mais ousados, os mais hábeis que singram na vida! Serão? Não se arrependera, no entanto, de ter conduzido toda a sua vida, com abnegação e espírito de sacrifício! Deus, que tudo ouve e tudo vê, haveria de a recompensar. Deixava fluir os dias, e numa atitude de dádiva aos outros, repartia-os, entre as suas atribuições profissionais e os seus hobbies que lhe preenchem as ânsias da alma. Era neste cenário que se preparava para a vivência de mais um Natal. Sentia uma alegria genuína, uma serenidade, há muito arredia, e a sua casa era disso um sinal bem evidente. Luzes multicores, acordes natalícios, numa ornamentação colorida, em amplexo envolvente, recebiam as visitas e os amigos, nessa quadra calorosa. Já pela noite dentro, depois de satisfeita a curiosidade das prendas, quando se preparava para ir assistir ao ritual da missa do galo, eis que se abre a porta, lenta e suavemente... Uma luz diáfana envolvia uma figura resplandecente, que balbuciou: - Estou aqui! Eu sou o J... o Jesus... o José, o Jorge, o João... aqueles que, nas procelas da vida, estiveram presentes e nunca te desampararam. Dalila teve um rebate... Aquele... demarcava-se dos outros, daqueles... que, antes de estenderem um braço, já o outro apresentava o orçamento! Sou... Aquele que, quando te sentias desamparada, a calcorrear, sozinha, os caminhos da vida, eram as minhas pegadas que vias, nos sulcos da areia, pois pegara em ti ao colo! Mª Donzília Almeida 21 de Dezembro de 2008

domingo, 23 de dezembro de 2007

Um conto de Natal

O REGRESSO DO IRMÃO PRÓDIGO
:
Nas vésperas da noite de consoada fal-ta sempre qualquer coisa mais ou menos importante para a festa da família, as-sociada, há muito, ao nascimento de Jesus. Prendas, sobretudo. Porque não se contava com a visita de um familiar, porque as destinadas ao filho mais velho ou mais novo não se coadunavam, afinal, com os seus desejos ditos em jeito de brincadeira, porque a filha precisava de algo diferente para decorar a sala.
Não cultivo muito o gosto de fazer compras, excepto de livros, mas acompanhei uma familiar pelas lojas mais na moda ou mais agressivas na publicidade aos seus produtos. Essa minha pouca apetência pelas compras não foi fruto de uma qualquer catequese mal alinhavada, que leva à conta de puro consumismo tudo o que diz respeito a dar lembranças em datas marcantes das nossas vidas, mas, sim, a uma inexplicável falta de habilidade. As prendas, no fundo, e em especial as de Natal e Páscoa, são normalmente sinais dos nossos afectos e do nosso amor para quantos nos rodeiam. Por isso, até foi com satisfação que acompanhei, também com a minha opinião, as últimas aquisições para a noite de consoada.
Depois de saltar de loja em loja, no Fórum de Aveiro, calcorreando os três pisos, o terceiro, lá no cimo, sem vendas, para respirarmos um ar mais puro, com bela oferta panorâmica, e feito o grosso das compras, achei, por bem, acomodar-me num banco emoldurado por decorações natalícias, com árvores de natal plastificadas, de cor verde, como que a lembrar que estamos em época com evidentes marcas de alguma esperança para todos, que é justo alimentar, pese embora a crise económica que muitíssimas famílias sofrem na pele e na alma, mormente quando não têm pão para saciar a fome a crianças e idosos.
Caminhando apressadas, numa lufa-lufa de um cansaço escondido pela alegria de apreciar e de comprar tanta coisa bonita, as pessoas nem tempo tinham para se olharem, não fosse dar-se o caso de se cruzarem com algum conhecido que emperrasse a ânsia de procura que a todos animava. Muitos rostos eram-me familiares, de tantos anos vividos por Aveiro. A estranha sensação de que toda a gente me é íntima e a conheço de qualquer lado, sem precisar de onde, trouxe-me a vontade de saudar ou de interromper a marcha de um ou outro transeunte. Contudo, soube manter-me em silêncio, limitando-me a apreciar as pessoas carregadas de sacos multicoloridos de traços originais. Com arte, até. Uns com símbolos natalícios, ligados ao natal cristão, outros ao natal profano, este bem representado pelo Pai Natal de paragens frias e longínquas. Outros, ainda, com manchas abstractas, em que sobressai, o que não é pouco, a beleza da combinação das cores.
A monotonia do meu quedar foi agitada, no entanto, por uma cara enrugada, de olhos azuis, que me não deixou indiferente. Era, no mínimo, e para já, um estranho que me olhava. Cabelo grisalho e ralo, bigode de traço fino, pele ressequida, dentes pintados pelo tabaco travado com sofreguidão, durante muitos anos. Alto e magro, de certa elegância.
De imediato, ouço a sua voz. A mesma de sempre:
– Manuel Fernando?
– Alberto!
– Há tantos anos!
– Nem sei há quantos!
O abraço, bem apertado, deu tempo para recordar o passado do Alberto. Filho de pais empresários. O mais novo dos três filhos. O menino mimado da casa, que a mãe, santa mulher, protegia com excessivo carinho. O pai condescendia. Os irmãos estudaram e cedo souberam encaminhar-se na vida. O Alberto preferia fingir que estudava e levava uma vida flauteada. Mais crescido, dormia de dia e divertia-se de noite. Os irmãos protestavam. Assim não iria a lado nenhum. Assim não teria futuro. Mas ele não ouvia ninguém. Nem queria ouvir. Não tinha nascido para trabalhar, costumava explicar entre amigos. Os pais eram ricos, garantia. Podia dar-se a esses luxos de nada fazer.
Depois a morte brutal dos pais num acidente de automóvel, na pujança da vida empresarial. Tanto trabalho para não gozarem nada, dizia-se na terra.
Os filhos mais velhos, o Carlos e o João, assumiram a liderança das empresas. Tentaram convencer o Alberto a dedicar-se ao trabalho. Se até aí nada fez, agora, então, é que nada queria fazer. O que os pais deixaram daria para tudo. Noites e noites nas discotecas de má fama, com vinho, algumas drogas leves e mulheres, hábeis em sacar dinheiro a quem o tem, fizeram do Alberto um homem sem norte.
Sair da terra natal foi ideia que uma noite lhe ocorreu. Correr mundo, instalar-se na capital da moda e da cultura. Paris, cuja fama e importância, de que tanto ouvira falar e tanto apreciava, foi projecto que começou a bailar-lhe nos horizontes curtos de onde nunca saíra. Quando os irmãos insistiam na urgência de os acompanhar na administração das empresas, dizia com sorriso trocista que não nascera para isso. E numa discussão mais dura, exigiu aos irmãos a partilha dos bens. E cada um que se governasse, gritou certa vez, para que ficasse clara a sua intenção.
Paris seria o seu futuro e um dia, comentava aos amigos, mostraria aos saloios, seus irmãos, como é que se vive a vida, aproveitando tudo o que ela tem para dar, de prazeres, do convívio com gente diferente, no centro da civilização…
Os irmãos bem o alertaram para o perigo da sua opção. Mas a decisão estava tomada. Partilhas feitas, preto no branco no notário, conta grossa no banco, o Alberto nem da família se despediu. Paris foi um corte radical com o passado. Nunca mais voltaria a esta pasmaceira da aldeia em que nasceu. O seu mundo seria um mundo de sonhos cor-de-rosa.
Uns anitos de vida airada e a afogar-se em vícios, explorado por quem calhava, com amigos que se tornaram abutres à espreita de atacar de forma fatal quem tinha dinheiro para tudo, depressa lhe toldaram alguma capacidade de pensar que seria natural possuir. Daí a alinhar com essa gente num negócio da noite foi um ápice. Enreda-se no tráfico de drogas e adormecido pelo vinho passa cheques ao deus-dará. Mulheres desses ambientes escuros fazem-lhe a cama. E de um dia para o outro o Alberto vê-se a contas com dívidas que nem sequer adivinhava. O tribunal decreta a falência do seu negócio. Resta-lhe o apartamento arrendado. Agora sem amigos. E sem amigas. Trabalho? Foi preocupação que nunca teve. Que fazer, então? Talvez um amigo mais próximo o ajudasse. Mas esse amigo nunca apareceu. Vende móveis e diversos bens pessoais por tuta-e-meia, embora valiosos. Não paga a renda. E a rua passa a ser a sua morada.
– E depois?
– Depois arrastei-me pela lama, caindo na miséria extrema. Ainda me convenci de que alguns conhecidos me dariam a mão para qualquer trabalho. Mas não. Fiquei um pobre de pedir. Quando podia, embora envergonhado, recorria a instituições de caridade para comer uma sopa quente. Nas esquinas de ruas movimentadas estendi a mão para o vinho e para o tabaco. Durante meses e meses passei fome. Mas nem assim quis pensar na família distante. As recordações da infância e juventude esgueiraram-se da minha memória. Ao mais pequeno sinal de que elas poderiam bater-me à porta, virava-lhes a cara. Neste Dezembro, frio como todos, notei, num ou outro recanto, que o Natal vinha a caminho. Talvez iniciativas de compatriotas que, no estrangeiro, mais intensamente vivem as festas tradicionais. Num rebate de consciência, entrei na Catedral de Notre-Dame. Há tantos anos que não sentia o silêncio de uma igreja. Há tantos anos que não olhava símbolos religiosos que nos elevam à trans-cendência! E foi aí, onde porventura balbuciei uma oração espontânea que nem sei explicar, que mais serenamente recuei no tempo para contemplar a bondade dos meus pais e dos meus irmãos.
– E então?
– Então, lembrei-me do Natal, do amor vivido no lar paterno, das alegrias partilhadas por familiares e amigos, dos pais queridos que nunca amei como eles mereciam, dos irmãos que tanto me aconselharam a ficar com eles… O regresso à terra começa a dominar-me. E dirigi-me, embora um pouco inseguro, a uma instituição de caridade.
– Estavas decidido…
– Ainda não. Faltava-me coragem para enfrentar os meus irmãos. Mas os dirigentes e funcionários da instituição mantêm comigo conversas prolongadas, durante alguns dias, julgo agora que de preparação psicológica. Apenas com os nomes dos meus irmãos, conseguem o contacto telefónico.
– E um dia…
– Um dia, de repente, passam-me o telefone num gabinete acolhedor. Era o Carlos. Não consegui falar. Mas ouvia bem o que ele dizia, já certamente informado da minha situação. “Tens de vir já neste Natal”, dizia-me o Carlos. E à mais leve tentativa de lhe explicar como estava a viver… “Não precisas de falar; falaremos quando chegares; mas tens de vir; todos te queremos cá”, adiantava o meu irmão. Reconheci-me, nesse momento, como o filho pródigo da Bíblia. Eu era o irmão pródigo à espera do amor dos irmãos.
– E já cá estás…
– Quando cheguei à estação da CP, em Aveiro, os meus olhos encheram-se de lágrimas. Certamente de alegria. Sempre a caminhar, com os meus parcos haveres numa mochila, atravessei a cidade, com a sensação de que tudo estava igual. Mas não. Havia grandes alterações, como reflexo de progresso económico. Não quis tomar o autocarro que me levaria à casa dos meus irmãos. Nem lhes telefonei para que me viessem buscar à estação, como eles tinham recomendado. Preferi a caminhada. Agora pela estrada ladeada de água da nossa ria. Vi salinas abandonadas, vi que os moliceiros e saleiros já não povoavam a nossa laguna. E à tardinha, quando toquei a campainha da casa do Carlos, uma jovem que me abriu a porta gritou: “É ele, é ele; entre, tio Alberto!” E todos, em catadupa, me abraçaram e beijaram. Ainda ensaiei uma qualquer explicação, mas logo o meu irmão me calou: “Vai tomar um banho que a festa vai começar.”

Fernando Martins

terça-feira, 7 de agosto de 2007

Os meus contos

O Piteira
Toda a gente da aldeia conhecia o Piteira. Era uma figura típica que não passava despercebida a ninguém. Não que fosse um artista, um pai de família exemplar, um proprietário de nome reconhecido na praça, um político de palavra fácil. Nada disso. Era simplesmente um “alma de Deus” e um ébrio incorrigível. Magro, pele tisnada pelo sol e pelos ventos salgados da maresia, beata ao canto dos lábios, sempre do lado esquerdo, boné à marinheiro, olhos bem abertos para o infinito, nunca fitava de frente fosse quem fosse, falava sem tino a maior parte do dia e até de noite. Pregava sermões não se sabe a quem, de quando em vez, mas não se conheciam animosidade de sua parte. Bebia tinto, sempre tinto, que outras bebidas o seu estômago não aceitava. Faziam-lhe azia, dizia a quem procurava saber o porquê dessa discriminação. Só o tinto, pois, e a qualquer hora, fazia dele um bêbado famoso nas redondezas. Mas era um bêbado cordato. Não se notavam nele tendências agressivas, não armava zaragatas e até fugia delas, não discutia com ninguém e frequentemente respondia, a quem o interpelasse com menos delicadeza, “quem está, está; quem vai, vai”. O Piteira deambulava pela aldeia, ao deus-dará, indiferente a tudo e a todos, à chuva e ao vento, ao frio e ao calor. Como quem busca qualquer coisa que sabe difícil de encontrar. E a quantos teimavam em saber a razão de ser da sua vida, o porquê de gostar tanto do tinto, respondia com o silêncio e com olhares mortiços. Às vezes indiferentes e não raramente altivos. Conjecturava-se sobre algum desgosto de amor, sobre alguma revolta social, sobre algum complexo que o amarfanhava. Mas a tudo isso o Piteira respondia do mesmo jeito, como quem não deve nada a ninguém: - Gosto de vinho, porque sim! – foi a única explicação que um dia deu, não se sabe porquê. Na família do Piteira não havia alcoólicos. Gente simples, trabalhadora, honesta, pacata, não gostava que o seu Piteira desse má nota dos seus. Mas nem por isso deixava de mostrar estima por ele, aceitando-o quando aparecia e dele cuidando com carinho. O Piteira comia pouco em casa de uns e de outros familiares. Nunca de amigos, que também os tinha. Às refeições bebia água, simplesmente. Depois de comer, senta-se num banco tão velho como ele, perto de uma figueira ainda mais antiga, do tempo dos seus avós. Por ali se quedava, pensativo e calado. Via os sobrinhos mais pequenos e deles se ria do que faziam e diziam. Com os mais crescidotes, embevecido, talvez recordasse os anos em que foi moço de salinas, onde trabalhava de sol a sol à torreira do calor abrasador e salgado. Em certos dias, sem sal para raer e para encher os montes nas eiras, o marnoto não lhe perdoava o não ter que fazer e lá o levava para as tarefas agrícolas no aido grande. Animava-o apenas o sorriso lindo e o ar donairoso das duas filhas do patrão, a Ermelinda e a Maria Rosa, que por ali passavam de quando em vez. Só por isso, valia bem esse esforço não remunerado do Piteira, em dias de tempo chuvoso ou sem sol que desse sal. Depois, num repente, saltava do banco e voltava às suas caminhadas, sem horizontes e como que perdido no tempo. Alheio a tudo, com a prisca ressequida e eternamente apagada que nunca lhe caía do canto esquerdo dos lábios gretados. Nos tascos por onde passava, inevitavelmente, havia sempre quem lhe oferecesse um copito de três, que ele engolia num trago e sem agradecer. Um aqui, outro ali, e tanto bastava para manter em alta o nível alcoólico que fazia do Piteira um doente crónico. Certo dia, um amigo, aproveitando ocasião de alguma lucidez, avançou com a ideia de o Piteira se tratar. Sempre podia ficar com mais saúde; o tratamento seria fácil; umas simples pastilhas receitadas por um médico seriam uma ajuda preciosa para começar a ter fastio pelo vinho. Depois poderia levar uma vida normal, com trabalho para não sobrecarregar ninguém; nem faltariam amigos e familiares que o amparassem, se estivesse de acordo. Até poderia casar e constituir família! Quando ouviu as palavras casar e família, o Piteira explodiu, como nunca ninguém o viu. Berrou sem nexo, praguejou com gestos agressivos. E fugiu. O Piteira saiu de cena na aldeia. O povo e a família estranharam a sua falta. Questionaram-se sobre o que teria acontecido ao Piteira: Por onde andará? Onde estará? Terá morrido com mais uma bebedeira mais forte? A polícia foi alertada e até apelos nas missas se repetiram. As buscas começaram. Ria e seus canais, cantos e recantos da aldeia foram batidos sem êxito. Terras vizinhas associaram-se às buscas. E nada. Quando a ideia da morte era ponto assente, o Piteira surgiu à luz do dia. Mais magro, com ar cadavérico e sem sinais de tinto. Lúcido. A família acolheu-o como filho pródigo. O nosso homem não deu explicações. Ninguém lhas pediu. O Piteira acamou em estado de exaustão. Recusava a comida. Esperava-se o pior. O médico bem receitou, mas o Piteira recusava sistematicamente os xaropes. A família, que o rodeava com muito carinho, pressentiu a hora da partida para a última caminhada. A vida esvaía-se lenta e firmemente. O Piteira, com a voz sumida, entrava em agonia. – Quero ver a Ermelinda… Quero ver a Ermelinda… – foram as suas últimas palavras. Fernando Martins

sexta-feira, 27 de julho de 2007

Os meus contos

A TITA


Estar no quintal, em dias de sol ou de chuva, é um dos prazeres que cultivo, como quem cultiva uma flor para desabrochar na Primavera. Olhar as árvores na hibernação, ver as plantas que nascem sem que alguém as tenha semeado, cheirar o verde ora viçoso ora mortiço da vegetação espontânea, experimentar o prazer de deitar a semente à terra e de ver as novidades, mais tarde, ferirem a crosta areenta e estrumada, tudo isto me encanta. 
Numa dessas tardes em que a contemplação me deixava voar ao sabor da maré que os ventos envolviam, a Tita surgiu apressada, como quem deseja chegar o mais depressa possível à meta que o seu instinto alimenta desde que nasceu. Passa por mim ostentando uma alegria inusitada e corre, corre, sem aparente explicação. Depois cheira tudo, em busca não sei de quê. Dou comigo a pensar que isso já nasceu com ela. Chama o companheiro Tótti, grita mesmo por ele, em jeito de quem quer alguém com quem possa partilhar a alegria de uma liberdade conquistada. Tótti dá-lhe o gosto e corre também, mas a Tita, logo depois, volta ao seu prazer de procurar. 

quinta-feira, 19 de julho de 2007

Os meus contos

MARIA DO CÉU


Com os anos a pesarem, a varredora arrasta-se no seu labor mecanizado na busca das folhas caídas do arvoredo. Empregada da empresa encarregada do asseio citadino, vejo-a com frequência da esplanada do bar onde matinalmente costumo saborear o café, de mistura com o ar puro que o parque me oferece. 
A mulher deambula de um lado para o outro indiferente aos olhares de quem está ou passa. Baixa-se com dificuldade, puxa com as poucas forças que lhe restam o saco preto de plástico semicheio de lixo, ergue-o a custo para o despejar no carro de mão e volta à cata de mais folhas, mas também de papéis atirados para o chão por gente graúda e miúda que corre apressada, sem cuidar de saber das recomendações que periodicamente se badalam para haver respeito pelo ambiente, que é propriedade de todos. De quando em vez, o capataz lá aparece para dar as suas ordens: 
– Olhe ali; quero isto limpinho como um brinco; não quero queixas de quem paga! 
Maria do Céu, assim se chama a mulher que me prende a atenção e me desperta os sentimentos nascidos à sombra de quem sofre e luta, obedece apressada sem mostrar enfado, num gesto maquinal de quem está habituada a cumprir ordens. 
De rosto cansado por vida agreste, os seus olhos claros e expressivos não escondem uma beleza que teima em se manter viva. Já reformada da indústria conserveira, continua a trabalhar porque tem de ser. Porque a sua reforma e a do marido, incapacitado por doença degenerativa, não dão para sobreviver. 
A renda de casa, a alimentação modesta e os medicamentos do dia-a-dia levam todo o dinheiro que chega no fim de cada mês. Os dois filhos, casados e com encargos familiares, não descobrem hipóteses de os ajudar, embora sintam ser sua obrigação olhar por quem lhes deu o ser e a educação.
Maria do Céu sabe disso e até já tem conversado com o marido, o Zé Morgado, lamentando a sina de quem nasce pobre. Com fracos ordenados, pouco puderam dar aos filhos para singrarem na vida, para além da arte da pesca costeira, que ambos assumem com alguma vaidade. Não são eles lobos-do-mar? O que ganham, porém, mal dá para educar os rebentos que vão crescendo e para o dia-a-dia, sem grandes aventuras. 
A meio da manhã, sol forte de Verão a convidar ao descanso, apenas por uns minutos, a varredora senta-se à sombra de uma árvore enorme, com décadas de existência a enfrentar as ventanias que assolam a região, em qualquer época do ano. 
De um saco de plástico com asas, dos que são oferecidos nas compras, sejam ricas ou triviais, tira uma sandes de qualquer coisa, que a distância não deixa perceber, e come, mastigando serenamente, como quem deseja perpetuar o tempo ali sentada. 
Maria do Céu não consegue esquecer o seu Zé. Agora lembra-se de como seria bom estar junto dele, apesar de a doença o levar a ficar cada vez mais rezingão. Protesta por isto ou por aquilo, mas logo a seguir dirige olhares de ternura para quem o acompanha, com muito amor, há mais de 40 anos. 
Os dois são um casal feliz, apesar das agruras da vida, desde o dia inesquecível do seu casamento na igreja matriz, onde juraram amor e fidelidade até à morte. Jovens, olharam para o futuro com esperança, alimentando sonhos que se foram multiplicando, ao mesmo tempo que muitos deles se esboroaram. Sem angústia, aceitam a pouca sorte que os acompanha, habituando-se a viver com o pouco que vão tendo. Ao bater do meio-dia, apressa-se a arrumar as alfaias do seu trabalho e vai apressada a casa, para ajudar o marido no que for preciso. 
O almoço, feito de véspera, é coisa simples, desde há muito: uma sopinha e fruta. Pouca porque é cara. Mas neste dia o seu José não quer comer. Diz-se cansado e sem apetite. Não resmunga e ao ralhete da mulher, para que coma, responde com um silêncio que a inquieta. Nem por isso, contudo, pensa que seja algo de grave. 
– Queres ir ao Centro de Saúde? – pergunta Maria do Céu. 
A resposta, lacónica, é um não ciciado. Nessa tarde, a varredora está ausente das suas obrigações profissionais. Os seus pensamentos voam para casa, para junto do homem que é a razão do seu viver. No parque, os trabalhos rotineiros sucedem-se, sem grande esforço mental. Mas o desejo que a domina diz-lhe para deixar tudo e para correr para junto do seu Zé. Correr como quem busca uma certeza: a de que ele está bem, que aquilo não passa de um incómodo passageiro. 
Ao bater das seis da tarde, larga tudo e parte apressada e ansiosa. José está prostrado, indiferente à vida. Maria do Céu olha-o, assustada, e grita pela vizinha. A ambulância leva-o, já a desligar-se do mundo, para o hospital. Não há nada a fazer. 
A varredora volta ao quotidiano, depois do luto estipulado por lei. Recusa o convite dos filhos para morar com eles, um mês em casa de cada um, para não se sentir abandonada. Não há quarto para a mãe, mas tudo se arranja. Não aceita. Nem quer pensar em deixar o lar modesto em que sempre vivera com o seu José. Ali vai continuar até Deus querer. Com as suas recordações, com sonhos realizados e por realizar, pisando o chão que foi de ambos, ouvindo os risos dos filhos pequenos, sentindo as palavras, as gargalhadas e a teimosia rezingona do homem que ama e a faz feliz. Aos fins-de-semana recebe a visita dos filhos e netos. Nos primeiros tempos de viuvez, com regularidade. Depois tudo volta a ser como dantes. 
Maria do Céu começa a sentir-se mais só. O trabalho regressa à normalidade. De manhã cedo, no parque verdejante e cheio de arvoredo, aprecia o ambiente de forma diferente, enquanto recolhe a natureza morta. Por lá ciranda muita gente. De quando em vez, há crianças que brincam, correm e jogam, perante os olhares atentos dos professores e educadoras. A varredora olha-as enternecida e regressa à infância dos seus filhos. Reconhece que está a rejuvenescer. 
Agora, todas as manhãs acorda com pressa de ir para o parque. O desejo de ver as crianças com tanta vida dá-lhe mais ânimo. E consegue trabalhar com um olho no lixo e outro na ingenuidade amorosa de quem começa o jogo da vida. Maria do Céu sente-se mulher para continuar a lutar. Até parece que não a afecta o peso dos anos. Nem sequer dá pelas dores nos ossos e músculos. E à noite, quando se deita, os seus pensamentos não conseguem sair do parque. 
De manhã, lá estará no meio de tudo e de todos, sem que ninguém a note e sem perturbar quem está. Há dias, numa tarde amena, contra o que era costume, não tem vontade de regressar a casa. Por ali está bem, presa a gestos e a sorrisos cantantes que lhe não saem do ouvido. À tardinha, as crianças deixam o parque com os seus acompanhantes e Maria do Céu resolve descansar um pouco. Sentada, junto da árvore que adoptou como sua, fecha os olhos e recorda o que a vida lhe havia dado de bom com seu Zé e seus filhos. Como tantas vezes havia feito ao longo da existência. Adormece tranquilamente, com a cabeça a cair-lhe sobre o peito. O capataz, ao vê-la assim, aproxima-se e pergunta: 
– Maria do Céu, então o trabalho? A varredora não responde. Foi encontrar-se com o seu Zé. 

 Fernando Martins